UMBANDA E CRISTIANISMO EM DIÁLOGO:

Uma analogia semiótica a partir do resgate social transignificado à imagem dos excluídos e dos marginalizados.

Daniel Gomes Ribeiro

Dedico esse trabalho de pesquisa à minha bisavó Lygia (In Memoriam) e ao seu guia espiritual preto- velho Pai André, pelo exemplo de amor concreto ao próximo que tanto influenciou a minha vida religiosa e acadêmica.

NOTA

É preciso aprender a ouvir o outro e numa atitude de empatia sentir o que ele sente ao fazer a exposição da sua doutrina. O conhecimento real do outro se faz através da ótica do outro. É uma questão de inculturação e não de doutrinação. O outro é uma riqueza para nós. (Rosangela Stürmer)

RESUMO

Nesta pesquisa, a partir de uma analogia semiótica encontrada em ambos os discursos salvíficos, percebemos a possibilidade ímpar de realizar um diálogo entre a Umbanda e o Cristianismo. Isto, porque, identificamos tanto na Umbanda, quanto na vida e obra de Jesus de Nazaré, o mesmo objeto de desejo social, ou seja, a necessidade fundamental de transignificar a imagem dos excluídos e marginalizados do povo em sujeitos religiosos e comprometidos com o emergir de uma nova sociedade, mais plural e menos exclusiva. Assim, com o intuito de aquilatar essa hipótese tão rica de signos e significados para nossa cultura, prática religiosa e convivência social harmoniosa, refletimos sobre a possibilidade de termos na Umbanda, religião genuinamente brasileira, uma congruidade com os mesmos estatutos epistemológicos fundantes da Boa Nova de Jesus de Nazaré. Este objeto de pesquisa nos traz, de forma surpreendente, essa novidade, ou seja, a oportunidade e a possibilidade de, através do imaginário coletivo e do discurso salvífico presentes na doutrina de Umbanda e nos Evangelhos, perceber a possibilidade impar de viabilizar um diálogo inter-religioso profícuo às necessidades socais urgerntes dos dias de hoje.

Palavras-chave: Umbanda, Cristianismo, Diálogo Inter-religioso, Alteridade, Resgate Social

INTRODUÇÃO

Existe uma falta de conhecimento e de compreensão, por parte de algumas religiões e culturas, do conteúdo religioso e ritualístico da Umbanda. Assim, no decorrer da sua existência, o culto de Umbanda vem sendo mal interpretado, situação que ganhou força com o advento das religiões cristãs fundamentalistas no Brasil. Desde então essa religião vem sendo alvo de críticas e seu culto comparado a ritos satânicos, em que seus “personagens” (figuras do sagrado) são constantemente comparados à realidade do mal na compreensão judaico-cristã e seus adeptos, veementemente, acusados de idolatria.  Dessa forma, esta pesquisa vem, em contrapartida, favorecer o diálogo inter-religioso da umbanda com as demais religiões cristãs.

A analogia semiótica à Boa Nova do mestre Jesus, a partir do resgate social transignificado à imagem dos excluídos e dos marginalizados revelado nos personagens do Evangelho e na história do Brasil colonial e imperial, nos levará a um novo paradigma, a uma nova forma de perceber e contemplar a riqueza existente no culto de Umbanda a partir da reconstrução interpretativa do seu imaginário, apresentando a sua verdadeira e profunda relação de adoração com o divino.

Faremos o leitor refletir a respeito do paralelismo encontrado entre a Umbanda e o Cristianismo, a partir do momento que, em sua contemplação salvífica, a Umbanda apresenta em seus estatutos epistemológicos o mesmo objeto de desejo social da Boa Nova de Jesus de Nazaré, ou seja, a mesma necessidade fundamental de transignificar a imagem dos excluídos e marginalizados do povo em sujeitos religiosos e comprometidos com o emergir de uma nova sociedade.

A Umbanda surgiu no início do século passado, trazendo em sua liturgia um entrelace cultural de crenças e valores contidos em praticamente todas as religiões e culturas presentes no Brasil, apresentando, assim, traços cristãos, espíritas, de tradições indígenas e de religiões de matriz africana; e, justamente, é essa dinâmica cultural que possibilita a formação de uma religião tão plural, ou seja, de tantas pertenças e de muitas possibilidades de diálogo.

Observando seu imaginário podemos notar que os seus personagens são retirados da própria história do Brasil desde a colonização; porém, com uma particularidade, foram criados à imagem dos excluídos e, por esse motivo, são compreendidos como as figuras do sagrado. Escravos velhos, crianças, índios, povos de rua, profissionais de baixo status social ou marginalizados entre outros, ganham na Umbanda os nomes de pretos-velhos, erês, caboclos, exus, encantados... Assim, essa religião segue como uma verdadeira memória coletiva do nosso povo, trazendo uma experiência cultural basilar que ultrapassa a que se encontra nos livros, nas artes etc.

Por ser a Umbanda uma religião de tradição oral, a fim de colaborarmos com a veracidade da pesquisa, foi utilizado, além do método bibliográfico, o método de observação realizado no Centro Espírita Casa de Oxossi Umbanda e Caridade, localizado no bairro de Bento Ribeiro, na cidade do Rio de Janeiro - RJ. Assim, a partir de toda a bibliografia pesquisada e das anotações realizadas no “terreiro”, formamos o primeiro capítulo que trata, justamente, do imaginário umbandista.

Traçamos, primeiramente, de forma bem sintética, a situação social classista do Brasil colonial e imperial, atentando o nosso olhar, principalmente, para os excluídos, tais como, as crianças, os índios, os negros, em especial os negros velhos, as profissões marginalizadas etc. Em seguida propomos a percepção do leitor à observação do paralelismo encontrado entre os excluídos do Brasil colonial e imperial com os personagens do imaginário umbandista.

Assim, encerramos o primeiro capítulo aquilatando a ideia de que a Umbanda nos leva a crer que o resgate social proposto através da apresentação do seu imaginário é parte intrínseca do seu discurso salvífico que, segundo as entidades entrevistadas, só se dá através do perdão ao próximo, da justiça social, do amor incondiciona, da misericórdia de Deus e da busca pela paz, valores anunciados pela Boa Nova de Jesus de Nazaré que são abordados no segundo capítulo deste trabalho.

O anúncio de Jesus e o seu olhar diferenciado para os excluídos e os marginalizados são apresentados a partir da inclusão dos “pequenos do Reino” na sociedade, ou seja, a partir do reconhecimento social e religioso desses personagens, entre eles, as crianças, herdeiras do Reino, as mulheres, os estrangeiros, as profissões tidas impuras etc., e percebemos que a instauração do Reino de Deus começa com o resgate social desenvolvido por esse grande mestre judeu. O segundo capítulo se encerra apresentando o discurso salvífico do mestre Jesus em favor do amor, da unidade, da justiça, da igualdade e da paz.

No terceiro capítulo, através do diálogo construído a partir da analogia semiótica dos imaginários e das propostas salvíficas apresentadas, pretende levar o leitor à percepção da estreita ligação dessas religiões no que diz respeito aos seus princípios fundantes; não somente em relação à opção pelos pobres, excluídos e marginalizados, como também pelo movimento de transignificação social e religiosa desses sujeitos na sociedade.

Assim, neste capítulo, convidamos o leitor à construção de um novo paradigma: a partir do discurso salvífico encontrado na doutrina da Umbanda e nos Evangelhos, promover um diálogo profícuo à instauração e manutenção da paz, ou seja, da liberdade, do respeito, da voz, da vez, do ser, do coexistir.

O IMAGINÁRIO UMBANDISTA

OS EXCLUÍDOS E OS MARGINALIZADOS DO BRASIL COLONIAL E IMPERIAL

Como sabemos, o Brasil foi “descoberto” em 1500 pelos portugueses que, 30 (trinta) anos depois, deram início ao seu processo de povoamento (SOUZA 2001). Assim, o princípio da história da infância no Brasil pode ser admitido a partir do translado das crianças que embarcavam nos navios de Portugal com destino ao Brasil, na época, conhecido por Terra de Santa Cruz.

Essas crianças vinham, basicamente, de três maneiras: como grumetes (serventes filhos de pobres), pajens (serventes filhos de baixa nobreza) e as meninas pobres de até 17 anos que eram retiradas dos orfanatos europeus para serem dadas aos nobres em matrimônio. A viagem marítima, em si, já oferecia muitos perigos a todos os embarcados, desde as péssimas condições de higiene até a alimentação que era muito precária (RAMOS, 2007, p. 23), principalmente para os grumetes.

Grumete era o nome dado às crianças que executavam os serviços de bordo nas navegações. Esses “pequenos marinheiros” tinham baixa expectativa de vida devido ao trabalho forçado e aos constantes abusos, inclusive sexuais, sofridos durantes as viagens. Essas crianças de aproximadamente doze anos eram alistadas pelos seus próprios pais a fim de aumentarem a renda familiar e reduzirem o efetivo da família, pois os pais bem sabiam que as chances de elas voltarem vivas eram improváveis.

Existiam, ainda, os recrutamentos frutos de sequestros, assim como, acontecera com as crianças judias arrancadas à força de seus pais (Ibidem, p. 22). Os pajens, em sua maioria, por serem filhos de uma baixa nobreza, eram mais respeitados que os grumetes, contudo esse fato não eliminava a possibilidade de também serem abusados igualmente por marujos. Quanto às meninas enviadas dos orfanatos era igualmente triste o destino de muitas delas, pois eram estupradas durante toda viagem e, por medo de perderem o direito ao matrimônio, não denunciavam os abusos, fato que acabava por aumentar os casos de estupro (Ibidem, p. 34).

Muitos são os relatos de violência contra a infância no Brasil desde o período colonial. Nas senzalas as meninas escravas de dez anos eram obrigadas a manter relações sexuais com seus senhores, e muitas dessas eram filhas dos seus próprios agressores. A mortalidade infantil nas embarcações que vinham de Portugal tinha um índice muito alto (ibidem, p. 27), contudo, algumas crianças conseguiam chegar ao solo brasileiro. Essas poucas sobreviventes, somadas, posteriormente, às crianças indígenas e negras, tornaram-se componentes do quadro da infância brasileira marginalizada ou excluída.

Contudo, não podemos deixar de citar que a infância perdida no Brasil, desde o seu processo de colonização, não ocorreu apenas entre os pobres e escravos, mas também entre muitos filhos de nobres e dos senhores de terra, pois essas crianças, desde cedo, eram preparadas para assumir os negócios da família ou cargos militares; eram vistas como pequenos adultos ou adultos em corpos infantis (ibidem, p. 48-49).

Após a chegada dos portugueses ao Brasil, principalmente com a descoberta das riquezas existentes, a colônia (Brasil) tornou-se economicamente importante para o enriquecimento de Portugal.

A partir desse momento iniciou-se um período em que o território brasileiro, movido pela perspectiva de exploração da coroa real portuguesa, tornou- se algoz dos seus próprios nativos, em que o “espaço e tempo do universo cultural do índio foram sendo moldados ao espaço e tempo do capital” (OLIVEIRA, 1997, p. 11). A tentativa de escravização dos índios, acompanhada da catequização, ocasionou o processo de destruição da cultura indígena e da perda de referência religiosa das tribos. Contudo, esse movimento de escravização não teve o êxito esperado. Assim, em decorrência dessa dificuldade com o índio, em função da sua resistência, aos poucos, sua mão de obra foi sendo substituída pela mão de obra do africano (ESTERCI, 1999, p. 103).

Muito ouvimos falar sobre o processo de escravização do negro e de todas as tribulações vivenciadas, principalmente, nas lavouras de cana, café e cacau. Contudo, ressaltaremos aqui, especificamente, a vida do escravo velho, a partir da execução da Lei do Sexagenário, no Brasil Império. Em setembro de 1885, reinado de Dom Pedro II, foi promulgada a lei de número 3.279 que garantia a extinção gradual do elemento servil, hoje, conhecida, historicamente, por Lei do Sexagenário.

Em seu artigo 3°, do parágrafo 10 ao 13, a lei citava que estavam libertos os escravos de 60 anos de idade, ainda que obrigados a prestar serviços para seus senhores por mais 3 (três) anos como forma de indenização pela sua alforria. O que nos chama muito a atenção nessa lei é o seu parágrafo 13, onde a relação de continuidade da escravização é sustentada no momento em que é afirmado que os negros velhos continuarão em companhia de seus ex-senhores, sendo alimentados, vestidos e cuidados, contudo, usufruindo os senhores dos seus serviços, ainda que compatíveis com as suas forças.

O trecho restante desse parágrafo traz a verdade que se encontrava por trás dessa lei, quando diz: “salvo se preferirem obter em outra parte os meios de subsistência, e os Juízes de Órfãos os julgarem capazes de o fazer” (PEREIRA, 1885). Na verdade “ninguém levou a sério o que a reação escravocrata pretendia apresentar como uma larga e generosa concessão” (PRADO JR., 1977, P. 181).

Jacob Gorender, no seu livro O Escravismo Colonial, faz severas críticas à alforria dos escravos com mais de sessenta anos, não pelo fato de se promover a liberdade, é claro, mas por ter dado aos senhores de escravo a oportunidade legal de se livrarem daqueles que não tinham mais força de trabalho. Ele, em seu estudo, observa que, em grande maioria, os negros que assumiam essa liberdade eram bem mais velhos que os parâmetros da lei e, em sua maior parte, inválidos (GORENDER, 1985, p. 355).

 

Gorender faz, ainda, menção aos inúmeros testemunhos que apontavam essa prática como comum em grande parte do Brasil, inclusive na corte do Império onde os escravos velhos e inválidos, também, eram abandonados às ruas eliminando assim os custos e as despesas dos engenhos, fazendas e residências. Podemos entender, a partir de uma leitura crítica dos fatos, que a Lei do Sexagenário constituiu-se em um crime contra a humanidade, pois não gerava liberdade e vida, mas sim, fome, desabrigo e morte.

Tivemos, desde o período do Brasil colônia, vários sujeitos marginalizados ou excluídos, assim como as crianças, os índios, os negros e todos aqueles que, de alguma forma, pelo ponto de vista da sociedade, transgrediam seus valores e suas leis. Dessa forma, permanece o Brasil desde o seu descobrimento até os dias de hoje. E foi, justamente, diante desse esmagamento social que surgiu como um verdadeiro brado de liberdade a religião da Umbanda – como o grito dos excluídos – uma “Boa Nova”, cujo estatuto epistemológico está alicerçado em um sistema de símbolos sociais que, quando são codificados, apresentam de forma clara um processo de resgate social a partir da ressignificação dos acontecimentos intrinsecamente ligados à sua linguagem imaginária, ou seja, “um sistema de mitos, símbolos e representações que se transignificam à imagem dos excluídos e marginalizados da nossa formação social” (LAPASSADE, 1972, p. 75).

O RESGATE SOCIAL TRANSIGNIFICADO À IMAGEM DOS EXCLUÍDOS E DOS MARGINALIZADOS NA RELIGIÃO DA UMBANDA

Observando o culto de umbanda praticado no Centro Espírita Casa de Oxossi Umbanda e Caridade, percebemos, assim como relata Renato Ortiz (ORTIZ, 1999), a presença marcante de 4 (quatro) grupos de entidades1, sendo elas: os erês, os caboclos, os exus e os pretos-velhos. Fato que nos chama muito a atenção, pois coincide, justamente, com os quatro grupos de excluídos do Brasil colonial e imperial sobre os quais relatamos o que sofreram, sendo eles: as crianças, os índios, os negros (principalmente os velhos) e os marginalizados.

Percebemos também que, na Umbanda, cada culto é destinado especificamente a uma entidade e que, dependendo do grupo (de entidades), os ritos parecem tender a uma ou outra religião, ou seja, ora apresentam traços cristãos, ora indígenas, ora africanos etc. Fato bem explicado por Brigida Carla Malandrino ao afirmar que é realmente possível observar na umbanda a presença de elementos diversos de várias religiões, porém, não como uma somatória de aspectos aleatórios, mas sim, com uma perfeita elaboração de sentidos e lógica entre eles, apontando a Umbanda como uma síntese semiótica oriunda das práticas religiosas dos povos bantos e iorubás por meio dos escravos, indígenas em decorrência da presença dos nativos e cristãos em função da colonização, todos também ligados à prática espírita kardecista trazida pelos imigrantes europeus (MALADRINO, 2010, p. 383 - 384).

Dentro do imaginário umbandista encontram-se os pontos cantados, músicas desenvolvidas pelos médiuns ou entidades que embalam o culto da Umbanda. Essas músicas, em sua maioria, fazem menção à realidade personificada (PRANDI, 1991, p.88) de cada entidade espiritual, dando-lhes identidade e significação. Assim, a partir da coleta dos pontos cantados nas giras do Centro Espírita Casa de Oxossi, Umbanda e Caridade e das performances particulares de cada entidade, quer seja na vestimenta, nos hábitos ou no linguajar, identificamos, de forma clara, essa associação existente entre os personagens da Umbanda e os excluídos do Brasil colonial e imperial (NEGRÃO, 1996).

Além dos arquétipos e das ferramentas tipicamente indígenas utilizadas durante o culto, o ponto cantado faz referência direta à relação entre as entidades chamadas de caboclos e índios. “Nós somos dois guerreiros; dois Irmãos Unidos! Meu nome é Tupaíba; sou filho de Aymoré! Na tribo dos Guaranis, me chamam de Peri!”2 Da mesma forma, os pontos destinados aos erês, assim como, suas vestimentas e traquinagens são estereótipos de crianças com “fome” de brincadeiras e alimentos. Este ponto cantado destinado ao Ere Doum tem muito a dizer: “Tem bala de coco e tem peteca. Deixa as crianças brincarem. Hoje é dia de festa e as crianças vêm saravá. Doum, Doum, Doum. Doum, Cosme e Damião. Doum, Doum, Doum brinca sentado no chão”.

O culto aos exus é um dos pontos altos dentro dos terreiros de Umbanda. Dentre todas as giras, os dias em que essas entidades incorporam (ORTIZ, 1999, p. 69) dobram, e até triplicam, os visitantes no Centro. Os exus (entidades masculinas) e as pombagiras (entidades femininas) são representantes autênticos dos excluídos e marginalizados (TRINDADE, 1985, p. 137). O ponto que segue faz alusão de que esta entidade, no imaginário umbandista, trabalhava em um cabaré: “Arreda homem que aí vem mulher! Arreda homem que aí vem mulher! Ela é a pombagira, a rainha do cabaré. Sete saias vêm na frente pra dizer quem ela é. Ela é a pombagira, a rainha do cabaré”.

Nas giras de pretos-velhos é onde podemos encontrar, através dos seus pontos, grande parte da experiência vivida pelos escravos velhos nas senzalas, pois os pontos, em sua maioria, retratam as dores e angústias dos cativeiros e dos trabalhos forçados. Segue um ponto cantado que expõe bem essa dimensão. “A história que eu vou contar parte qualquer coração é a história dos pretos-velhos no tempo da escravidão. Negro amarrado no tronco, negro jogado no chão, negro com ombro sangrando da chibata do patrão. De dia trabalhos forçados, castigo à noite nem se fala, negro gemendo de dor lá nos fundos da senzala. E ainda se ouve o lamento negro no céu a clamar: “Maleime, meu Pai, maleime! Maleime, meu Pai Oxalá!”

Como assevera Ortiz (ORTIZ, 1999, p. 70-75), a partir dessa breve explanação com auxílio dos pontos cantados, podemos identificar a relação entre os excluídos do Brasil e as entidades da Umbanda. Assim, partindo dos relatos e observações feitas durante o período de pesquisa em campo no Centro Espírita Casa de Oxossi, Umbanda e Caridade, percebemos que há uma possibilidade de a Umbanda, ainda que de forma subliminar, a partir da ressignificação dos seus personagens, remontar o ambiente plural do Brasil pós- descobrimento.

Nas giras dos erês observamos uma quantidade excessiva de brincadeiras e comidas. Esses espíritos manifestados em seus médiuns “apresentam comportamentos de crianças: engatinham, choram, chupam os dedos e falam num linguajar infantil. Dão ao culto uma dimensão de alegria e de folguedo” (NUNES PEREIRA, 2006). Essa festividade nos fomenta, a partir da história da infância no Brasil, a ideia de que essa religião pretende em seu rito recompensar a infância perdida desde a sua colonização, dando às crianças (erês) o direito a boa alimentação e a diversão.

Quanto aos caboclos, esses se apresentam, em sua maioria, de forma bruta, socando o peito e com movimentos ríspidos como se estivessem demonstrando força e tonicidade juvenil. Apresentam-se como verdadeiros guerreiros, fato que nos levou a relacionar sua imagem à imagem dos jovens da nossa sociedade atual. Segundo Renato Ortiz os caboclos representam ou “são espíritos de nossos antepassados índios que passaram depois da morte a militar na religião umbandista (ORTIZ, 1999, p. 71)”.

O que notamos é que tendo o índio resistido ao sistema escravocrata no período colonial, na religião de Umbanda, ele representa, também, de forma transignificada, a esperança, a resistência e a força da juventude que não deve se deixar dobrar pelo sistema atual, mas, pelo contrário, deve resistir e lutar contra o poder dominador e absolutista.

Dentro do imaginário umbandista surge de forma marcante as figuras dos pretos-velhos, sendo encontradas, inclusive, ainda que de forma subliminar, em literaturas infantis como a do Sítio do Pica-Pau-Amarelo, na figura do Tio Barnabé. Essas entidades, diferente das demais, apresentam algumas particularidades como a ideia de familiaridade ao condicionar uma relação próxima com os adeptos da comunidade religiosa, no momento em que os mesmos são levados a chamá-los pelos nomes de vovó, vovô, tio, tia, pai e mãe.

De acordo com Renato Ortiz os pretos velhos representam ou “são espíritos dos antigos escravos negros que pela sua humildade tornaram-se participantes da Lei da Umbanda”. Quando eles vêem (incorporam) no terreiro, o corpo do médim se curva, como a de uma pessoa idosa, abatida pelo peso dos anos. Alem do movimento corporal, falam com voz rouca, firme, mas suave, prudente, cheia de afeição, o que transmite uma sensação de segurança e familiaridade àqueles que vêm ao seu encontro (Ibidem, p. 73).

A História nos diz, mesmo sem muita precisão, que o negro no passado foi considerado desalmado (PINTO, p. 7). Essa afirmativa nos lança diretamente a uma boa reflexão visto que, na Umbanda, nas giras de pretos-velhos, a saudação dada a essas entidades é “Adorei as almas!” Ou seja, ainda que possa ser vista como coincidência, pois se trata apenas de uma interpretação, essa saudação parece carregar um sentido ontológico de resgate social, uma vez que leva o adepto a dizer que as almas do mundo são representadas pelos negros, como podemos constatar no ponto cantado: “Eu adorei as almas, eu adorei as almas no dia de hoje, eu adorei as almas, as almas de Pai Cipriano, / Eu adorei, eu adorei as almas de vovó Catarina, eu adorei, eu adorei as almas de vovó Joaquina, eu adorei, / Eu adorei as almas de...” E, assim, o ponto segue fazendo menção a todas as almas dos pretos- velhos. Ou seja, se no passado o negro foi considerado sem alma, na Umbanda ele representa as almas do mundo.

Observamos, no Centro Espírita Casa de Oxossi Umbanda e Caridade, que a afirmação de Negrão a respeito do imaginário de exus e pombagiras ligando-se à questão dos excluídos e marginalizados do povo é contundente, pois está em consonância com os pontos e os relatos de alguns exus que entrevistamos (NEGRÃO, 1996, p. 132). O Exu Tranca-Rua, por exemplo, diz ter sido um sacerdote excomungado da religião. O Exu Tiriri se apresentou como um médico afastado da sua profissão em função do abuso de bebidas alcoólicas. Outros exus se apresentaram como malandros, prostitutas, etc; sujeitos excluídos ou marginalizados pela sociedade por questões diversas.

Em nossa pesquisa de campo observamos que, nos ritos da Umbanda, essas entidades conhecidas por exus costumam ser festivas e suas giras muito descontraídas. As entidades mostram-se amigas e predispostas a ajudar as pessoas em suas dificuldades físicas mentais e espirituais. Vimos, também, que exus e pombagiras esboçam uma espécie de alegria quando as pessoas, confiando na sua competência e, acima de tudo, acreditando na força da sua palavra (orientação), estreitam a sua relação com eles, em alguns casos sendo até chamados de compadres. Exu é vida, comunicação, alegria, fertilidade...

Maggie afirma que os modelos desprestigiados socialmente, quando expressos no ritual da Umbanda, não se tornam, apenas, entidades de prestígio, mas figuras do sagrado (MAGGIE, 2001, p. 118). Assim também identificamos, a partir da observação realizada no Centro Espírita Casa de Oxossi, Umbanda e Caridade, essa mesma alusão, ou seja, a construção de um imaginário umbandista como contraposição à prática excludente vivida pela sociedade colonial, imperial e, também, nos dias de hoje, revalorizando e estreitando as relações sociais quer sejam culturais, religiosas ou étnicas entre as entidades e as pessoas.

O DISCURSO SALVÍFICO NA UMBANDA

 A partir da historicidade relatada, referente aos excluídos e marginalizados do Brasil colonial e imperial, e da experiência vivida no período de pesquisa em campo pensamos na possibilidade de essa religião estar propondo, a partir da sua transignificação, um discurso salvífico permeado no conceito e prática do perdão, reconciliação e da libertação (DIAS, p. 287). Percebemos que, quando uma pessoa pede a bênção ou se prostra diante de uma entidade, não se trata de uma adoração a um espírito ou a um médium, pois esse rito de adoração transcende à atual existência e ao tempo presente.

Em verdade, esse ato leva-a de volta, ontologicamente, à senzala, às aldeias, à infância perdida, às ruas, e lança-a, como sociedade, aos pés dos marginalizados, ato que a incuta, intrinsecamente, estar face a face com a imagem de um ser injustiçado, excluído e abandonado pela estrutura social existente no Brasil em função dos interesses econômicos, políticos e sociais desde o período colonial.

Entendemos, a partir da leitura dos fatos, que no culto da Umbanda a proposta salvífica está intrinsecamente ligada à ideia de resgate social que é compreendida, justamente, no momento em que o excluído ou marginalizado social vem em auxilio à sociedade que o condenou. Um ato de perdão representativo, por isso simbólico, que conduz os adpetos à resolução dos conflitos individuais ou coletivos, quer sejam entre a entidade e o médium, a sociedade e a entidade (figura do sagrado) ou entre a figura do opressor e a do oprimido.

Mais do que o consciente social, essa ação age diretamente na conciliação da sociedade (sujeito) com seu próprio inconsciente histórico (ibidem pag. 218). Nossa dívida, como sociedade brasileira, com as exclusões do Brasil colônia e império até os dias de hoje, nos faz perceber na Umbanda uma fonte inesgotável de resgate espirital, por isso social, de perdão indiviual e coletivo e de contemplação do sagrado à imagem dos “sacrificados” pela sociedade.

Assim, dentro do imaginário umbandista, de forma singular, aparece a figura do preto-velho que, apesar de representar a ancestralidade africana, é a entidade espiritual que mais concentra elementos de pertença cristã (católica). Além da fé nos orixás, os pretos-velhos trazem consigo o rosário, a santa cruz, as rezas e a fé vivida e transmitida aos seus fiéis que agregam, em seu ideal salvífico, uma lógica coerente ao discurso cristão (Ibidem pag. 160). Muitas das suas orações fazem analogias do sofrimento de Jesus ao de um velho no cativeiro.

No Centro Espírita Casa de Oxossi Umbanda e Caridade, identificamos, no início do culto, um ato penitencial bem análogo à religião cristã neste ponto cantado: “A lua lá no céu brilhou quando Jesus ferido na cruz falou, a sua mãe Virgem Maria chorou. Jesus Cristo aos seus inimigos perdoou”. A partir de uma analogia semiótica podemos criar um paralelo entre o ato penitencial e a ideia de que as entidades espirituais que lá se encontram, representantes dos marginalizados e excluídos nos períodos do Brasil colonial e imperial, perdoaram aqueles que o oprimiram no passado e que, através da prática ritualística do culto de Umbanda, buscam uma reconciliação com a sociedade que as condenou.

Em entrevista, no dia 12 de setembro de 2012, no Centro Espírita Casa de Oxossi, Umbanda e Caridade, registramos o posicionamento religioso, a respeito da salvação, da entidade Pai José de Angola (guia espiritual do médium Carlos Augusto). O Preto-velho afirmou que “salvação não é só se salvar, meu filho... Mas salvar também seu semelhante, sem distinção. Salvação é você buscar encarnado ou desencarnado todas as virtudes do Pai maior. Perante o Pai maior, todos os filhos da terra como do outro plano estão salvos, mas em algum momento principalmente aqueles que sofrem acham que não estão salvos ou foram esquecidos por Deus, uma verdadeira bobagem.

O Pai maior é misericordioso, caridoso, amável, justo, piedoso, iluminado e sempre perdoa seus filhos. No meu entendimento, encontrar a salvação é buscar dentro de si e de seu mano (irmão) todas essas qualidades do Pai maior... E é nessa hora que você sente a presença dele ou de algum mentor espiritual de luz, dentro de seu coração. Mas não se esqueça de que nesse momento você está colocando ou mostrando o que é salvação para seu mano; mesmo que, no entendimento desse mano, ele não compreenda tal fato. É aí que nos deparamos com o resgate, o reencontro, a evolução, não o sofrimento, mas sim a libertação, o desapego (dar sem receber) e o desenvolvimento. Não existe melhor ou mais verdadeira salvação que esta: a paz interior que tanto o Pai maior quer para seus filhos de Fé”.

Pai José nos aponta algumas chaves para o caminho da salvação ao afirmar que é na busca pela salvação do outro que eu encontro a minha salvação. Para Pai José, o caminho da salvação encontra-se em nossa busca intrínseca pela prática do bem, tendo, em nós, as mesmas virtudes que existem em Deus. Ao final do seu discurso ele proclama uma das maiores condições para que haja a salvação, que é a libertação e a busca pela paz. Podemos, assim, perceber que a linha de ação no processo de libertação salvífico da umbanda, dar-se-á, principalmente, através do perdão que liberta, reconcilia e pacifica.

O CAMINHO DO MESTRE JESUS

OS EXCLUÍDOS E OS MARGINALIZADOS DE ISRAEL

Existem, dentro da História geral, várias possibilidades de abordagem da condição em que viviam as crianças, as mulheres, os pobres, os doentes, os estrangeiros (outras religiões), os homens com profissões tidas impuras etc., em Israel, desde o período das tribos até o nascimento do mestre Jesus. Porém, iremos retratar esse fato a partir do próprio cenário apresentado nos livros da sagrada escritura judaico-cristã. O motivo pelo qual discorreremos dessa forma é bem consensual, uma vez que a história e os ensinamentos de Jesus de Nazaré não estão escritos em nenhum livro histórico-científico.

Sendo a história do povo hebreu composta por vários momentos significativos, quer sejam religiosos ou políticos, fixar-nos-emos na história dos excluídos e marginalizados após o regime tribal. De acordo com Isidoro Mazzarolo o período tribal foi um momento histórico, em que o povo hebreu vivenciou a prática de uma política interna mais justa e igualitária. Esse sistema de administração política, regida pelos juízes, “conferia à máquina estatal um esquema de participação amplo e corresponsável”. Consta nesse período, inclusive, a presença de mulheres na liderança do povo (MAZZAROLO, 2005. p. 29-31).

 

Mazzarolo afirma que, com a crise do sistema tribal, os hebreus, pressionados pela política comercial das cidades-estado, clamam por uma transição política (Ibidem, p. 32, et seq). A partir da passagem bíblica encontrada no livro de Samuel, retrataremos essa transição política que passa do sistema das tribos para o monárquico e aponta os direitos do rei sobre o povo.

Ele convocará os vossos filhos e os encarregará dos seus carros de guerra e dos seus cavalos e os fará correr à frente do seu carro; e os nomeará chefes de mil e chefes de cinquenta, e os fará lavrar a terra dele e ceifar a sua seara, fabricar as suas armas de guerra e as peças de seus carros. Ele tomará as vossas filhas para perfumistas, cozinheiras e padeiras. Tomará os vossos campos, as vossas vinhas, os vossos melhores olivais, e os dará aos seus oficiais (...) Exigirá o dízimo dos vossos rebanhos, e vós mesmos vos tornareis seus escravos (BIBLIA SAGRADA, I Samuel 8, 1-17).

A partir desse momento o povo começa a viver um novo período, agora monárquico. As classes sociais apareceram mais nitidamente, pois a hierarquia monárquica arrebanhou muitos funcionários para seus serviços, assim como retrata o texto. Segundo Mazzarolo a crise do sistema tribal “foi provocada por muitos que esperavam o momento de desfrutar os suores dos outros” (MAZZAROLO, 2005. p. 35). Como em qualquer sistema capitalista ou neoliberal, todo excedente gera exclusão (ALVES, 2000. p.76).

Dessa forma, discorreremos, primeiramente, relatando a história dos excluídos por questões financeiras em Israel. O profeta Jeremias, observando o processo absurdo de empobrecimento do povo, percebeu que o sistema, cada vez mais opressor, se afastava do projeto de Deus em prol do enriquecimento das classes dominantes. Jeremias denunciava a maldade do sistema que passava dos limites, não exercendo a justiça adequadamente. O texto já faz referência, inclusive, à presença de indigentes na sociedade (BÍBLIA SAGRADA, Jeremias 5, 28).

Contudo, nesse contexto apresentado, o que nos chama a atenção é que a miséria gerada pelo sistema afasta o homem da sociedade, pois ela começa a ser vista como um castigo de Deus. Nesse momento a religião se apresenta como a salvadora fazendo uso da teologia da retribuição. Segundo Reimer (REIMER, 2006, p. 31), essa teologia dava às classes dominantes a desculpa perfeita para a causa da pobreza na sociedade e permitia que o templo explorasse ainda mais os necessitados.

Esses, além de excluídos socialmente, eram, também, vistos como impuros e pecadores. A teoria da retribuição gerava muita riqueza para as classes dominantes, principalmente para o templo (BÍBLIA SAGRADA, Levíticos 4). Em Israel era comum um homem doente ser obrigado a sair do convívio social, do trabalho, da família, do templo etc., sendo, assim, exilado para longe da cidade (BÍBLIA DO PEREGRINO, Verbete, p. 3007).

De acordo com Moacyr Scliar, a doença com a qual o Antigo Testamento mais se preocupa é a lepra, objeto de uma minuciosa descrição no Levítico. Há inclusive critérios diagnósticos, e critério diagnóstico é elemento clássico nos programas de saúde pública. Mas o objetivo não é tratar o doente de lepra, o objetivo é isolá-lo, porque a lepra é uma doença impura. E por que a lepra é uma doença impura? Porque resulta de contato entre corpos, e esse contato entre corpos frequentemente tem uma conotação sexual; do Oriente Médio daquela época, como até hoje, sexo é uma coisa olhada com muita restrição, se não é praticado no contexto do casamento.

 

É claro que o rótulo de lepra incluía muitas outras doenças de pele, porque eles não tinham, evidentemente, maneiras de fazer um diagnóstico diferencial. Mas o que importa é isso, é que doença é usada como um critério para exclusão de determinados indivíduos que comprometem a coesão do grupo social - e não para tratar esses indivíduos. (SCLIAR, 2002)

A doença não era diagnosticada por médicos, mas por sacerdotes e os mesmos eram, também, os responsáveis pela cura do doente. Nesse caso também era empregada a teologia da retribuição como já vimos anteriormente. O Antigo Testamento também nos relata que, além de toda a questão física gerada pela doença, o sujeito era obrigado a anunciar pela cidade que era impuro; fato que acarretava um cruel estigma moral e emocional para o doente (BÍBLIA SAGRADA, Levítico 4-12). A Bíblia nos relata que não era possível uma pessoa aproximar-se dos leprosos, pois se acreditava que quem os tocasse também se tornava impuro (ibidem, 3, 1-5).

Contudo, não devemos recriminar hoje a intenção da lei mosaica, porque “de certa forma o Antigo Testamento é o paradigma para o sanitarismo” como afirma Scliar (SCLIAR, 2002). As medidas adotadas por Moisés, como afastar o sujeito da sociedade, pôr fogo em suas roupas, cortar seus cabelos e lhe impor o uso de máscaras, não são tão diferentes das utilizadas hoje pelo sistema de saúde quando se diagnostica a presença de bactérias ou vírus em pacientes internados. Entretanto algumas medidas adotadas na lei mosaica, ainda que em favor da vida, acabavam por gerar um grande mal social que é a exclusão e a marginalização do doente.

 

Quando falamos de excluídos, a figura da criança órfã e da mulher viúva encontra-se arraigada na boca dos profetas11. Contudo para dar ênfase ao que nos propomos, ou seja, deixar clara a situação social de exclusão que vivia grande parte dos órfãos e das viúvas naquele momento histórico, faremos uso de uma passagem do Antigo Testamento em que o profeta Isaias, vendo o trato dado a esses sujeitos excluídos da sociedade, diz:

Lavai-vos, limpai-vos, as injustiças que praticais, tirai-as da minha vista. Aprendei a fazer o bem, parai de fazer o mal, defendei o direito do oprimido, buscai o que é correto, fazei justiça ao órfão, defendei a causa da viúva. Depois, vinde e podemos discutir (BÍBLIA SAGRADA, Isaías 1, 17-18).

Nessa passagem Isaías denuncia que não suporta mais ver tanta maldade misturada com festa religiosa, afirmando que mesmo uma enorme quantidade de orações não faria Deus atender aos pedidos do povo. Assim, no final do discurso, Isaías anuncia, deixando claro que para Deus a maior oferta é o povo viver de forma justa, principalmente, em relação às viúvas e aos órfãos. Segundo Albert Nolan12 as viúvas e os órfãos que não tivessem quem os sustentassem não teriam, naquela sociedade, nenhuma forma de ganhar a vida; sendo assim, viveriam de esmolas (NOLAN, 1987. p. 41).

Dando continuidade à abordagem feita a respeito dos excluídos e dos marginalizados até os dias de hoje, encontramos as mulheres sendo oprimidas e sofrendo várias discriminações sociais, tais como: salários inferiores, problemas em relação à maternidade, abusos morais e sexuais etc. Levando em conta a historicidade do povo hebreu, podemos frisar esta abordagem, acerca do tratamento dado à mulher, apresentando o mandamento de Moisés que diz: “Não cobiçarás a casa do teu próximo, não cobiçarás a sua mulher, nem o seu escravo, nem a sua escrava, nem o seu boi, nem o seu jumento, nem coisa alguma que pertença a teu próximo” (BÍBLIA SAGRADA, Êxodo 20, 17).

Como observamos, a lei aferia a condição da mulher na sociedade como propriedade do homem e a sua submissão ao marido era de caráter, inclusive, religioso. Como nos relata o Antigo Testamento, aos olhos da sociedade, a mulher virtuosa era aquela que vivia de acordo com as tribulações incutidas pelo homem, como podemos observar no livro dos Provérbios.

Cinge a cintura com firmeza, e emprega a força dos braços. Sabe que os negócios vão bem, e de noite sua lâmpada não se apaga. Lança a mão ao fuso, e os dedos pegam a roca. Estende a mão ao pobre, e ajuda o indigente. Se neva, não teme pela casa, porque todos os criados vestem roupas forradas. Tece roupas para o seu uso, e veste-se de linho e púrpura. Na praça o seu marido é respeitado, quando está entre os anciãos da cidade. Tece panos para vender, e negocia cinturões. Está vestida de força e dignidade, e sorri diante do futuro. Abre a boca com sabedoria, e sua língua ensina com bondade. Vigia o comportamento dos criados, e não come pão no ócio. (Ibidem, Provérbio 31, 10-27 - grifo nosso)

A partir do versículo 10 (dez) podemos perceber que a mulher, além de exercer serviços pesados, não tinha muito descanso, pois nem “de noite a sua lâmpada não se apagava”. Seu comportamento “correto” era causa de galardão para seus maridos, além de cuidar de todo o serviço da casa e da lavoura, produzia produtos e os comercializava. Contudo, o que nos chama muito a atenção é o versículo 27 (vinte sete) que diz: “e não come pão no ócio”.

No livro do Gênesis, no Antigo Testamento, encontra-se uma passagem que durante muito tempo foi responsável, por ter sido compreendida, de forma fundamentalista, pela submissão que a mulher deveria ter ao homem. Essa leitura alegórica deu subsídio para inúmeras tribulações e discriminações sociais e religiosas contra a mulher.

A serpente era o mais astuto de todos os animais que Javé Deus havia feito. Ela disse à mulher: É verdade que Deus disse que não deveis comer de nenhuma árvore do jardim? A mulher respondeu à serpente: Nós podemos comer dos frutos das árvores do jardim. Mas do fruto da árvore que está no meio do jardim, Deus disse: "Não comereis dele nem lhe tocareis, de contrário morrereis". Então a serpente disse à mulher: Não, não morrereis. Mas Deus sabe que, no dia em que comerdes o fruto, os vossos olhos abrir-se-ão e tornar-vos-eis como deuses, conhecedores do bem e do mal. Então a mulher viu que a árvore tentava o apetite, era uma delícia para os olhos e desejável para adquirir discernimento. Pegou no fruto e comeu-o; depois deu-o também ao marido que estava com ela, e também ele comeu. Então abriram-se os olhos aos dois, e eles perceberam que estavam nus. Entrelaçaram folhas de figueira e fizeram tangas. (Ibidem. Livro do Gênesis, capítulo 3, 1-7)

Segundo Candiotto, nessa passagem, em função da associação que a serpente tinha com algumas culturas e religiões que a colocavam como símbolo da fertilidade, muitas vezes foi dada uma conotação sexual para todo o relato bíblico. Dessa forma, “sendo a mulher orientada pelo princípio do prazer, sucumbe com facilidade e conduz o homem ao mesmo caminho. Daí a necessidade de que a mulher seja submissa ao homem, de modo que ela não o leve a desviar o seu coração da adoração do único Deus” (CANDIOTTO, 2008, p. 41).

 

A mulher antes do casamento era mantida reclusa e a menstruação (ou problemas ginecológicos) era considerada impureza. Ela não podia falar em assembleias e não podia participar dos cultos religiosos. São inúmeras as tribulações que a mulher passava em Israel, numa vida reclusa e excluída de direitos, tudo acrescido do fácil processo de marginalização acarretado por qualquer descuido comportamental, por ela cometido, prescrito pelas leis do Estado.

De acordo com Nolan, dentre os excluídos e marginalizados também se encontravam os homens e mulheres de profissões impuras tais como: “prostitutas, coletores de impostos (publicanos), ladrões, pastores, usurários e jogadores” (NOLAN, 1987. p. 42). Poderíamos, ainda, retratar com particularidade toda a questão social de Israel, em relação aos excluídos e marginalizados, assim como a relação com os povos de outras culturas e religiões: os cananeus, os samaritanos, os pagãos, entre outros.

Contudo esse não é o nosso objetivo central, pois, apenas, utilizamos esse primeiro subcapítulo para situar o leitor acerca da sociedade desigual e injusta encontrada pelo mestre Jesus de Nazaré, cujo cerne de pregação encontra-se, justamente, a partir da lei judaica, reinterpretando-a e dando um novo rumo à sociedade israelita. Dessa forma, observaremos que o caminho de Jesus pressupõe um movimento de (re)educação do povo, uma rede de inclusão e de (re)inversão de valores, de tal modo que, no Novo Testamento, os que antes eram vistos como desprezíveis aos olhos da sociedade são para Jesus as sementes do Reino de Deus (BÍBLIA SAGRADA, Mateus 21, 31).

 

O RESGATE SOCIAL TRANSIGNIFICADO À IMAGEM DOS EXCLUÍDOS E DOS MARGINALIZADOS NA BOA NOVA DE JESUS DE NAZARÉ

Embora Israel vivesse uma formação social injusta e desigual em função das classes dominantes, a vontade de Deus sempre esteve presente, mas, como nos relata o Evangelho de João, capítulo 1 (um) a partir do versículo 11 (onze), os seus não a receberam, ou melhor, não cumpriram a sua determinação, porque sempre utilizaram a lei em benefício próprio. O Novo Testamento vem, justamente, apontar que Jesus, ao contrário dos escribas, observava a lei com veemência e fidelidade:

Não penseis que vim revogar a Lei e os Profetas. Não vim revogá-los, mas dar-lhes pleno cumprimento, porque em verdade vos digo que, até que passem o céu e a terra, não será omitido nem um só i, uma só vírgula da Lei, sem que tudo seja realizado. Aquele, portanto, que violar um só desses menores mandamentos e ensinar os homens a fazerem o mesmo, será chamado o menor no Reino dos Céus. Aquele, porém, que os praticar e os ensinar, esse será chamado grande no Reino dos Céus. Com efeito, eu vos asseguro que se a vossa justiça não exceder a dos escribas e a dos fariseus, não entrareis no Reino dos Céus (ibidem, Mateus 5, 17-20).

Segundo Vasconcelos o caminho percorrido por Jesus “causou modificações e alternativas em favor da justiça e do resgate da dignidade dos excluídos e marginalizados (VASCONCELOS, 2007, p. 207). O cerne da pregação de Jesus permeou a ideia de promover um resgate social a partir do reconhecimento e da reinclusão social e religiosa dos excluídos e marginalizados pela sociedade classista israelita.

 

Dessa forma, o mestre de Nazaré inicia sua caminhada pregando um discurso salvífico, por isso de libertação, para os excluídos e marginalizados (MAZZAROLO, 2005, p. 131), ou seja, homens de profissão considerada impura; mulheres adúlteras ou prostitutas; pagãos, samaritanos, cananeus, bem como os doentes, os pobres, as viúvas, as crianças, entre outros.

Para compreendermos o processo de resgate social proposto por Jesus de Nazaré faz- se necessário entendermos, antes, o que Jesus queria dizer quando se referia à instauração Reino de Deus. De acordo com Nolan, o Reino de Deus “anuncia um futuro estado de coisas na terra, quando o pobre não seria mais pobre, o faminto seria saciado e o oprimido não seria mais miserável” (NOLAN, 1987, p. 74). Segundo Paulo, em sua Carta aos Romanos, capítulo 14 (quatorze), versículo 17 (dezessete), o Reino de Deus é um reino de justiça, onde prevalecerá a paz e a felicidade.

No contexto social judaico os detentores da verdade eram os doutores da lei que, responsáveis pela interpretação desta, tornavam-se absolutos diante do povo, responsáveis por interpretá-la e aplicá-la na sociedade (BÍBLIA SAGRADA, Verbete, p. 1234). Com a ascensão de Jesus à vida pública e com a sua capacidade de (re)interpretação das leis (ibidem, Mateus 5, 21), surge uma grande questão: Quem está com a verdade? No Novo Testamento consta que Jesus responde essa pergunta afirmando: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida” (ibidem, João 14, 6).

Segundo Grüm, para termos a ideia real do que ele quis dizer quando faz essa afirmação, precisamos saber qual o conceito grego dessa palavra. Verdade, do termo aletheia, significa que o véu que encobre a realidade foi retirado e que nós contemplamos a realidade abertamente, assim como ela é (GRÜM, 2006, p. 96). Ou seja, Jesus apresenta a vontade de Deus expressa na sua lei e nos profetas, de forma clara, sem usá-la de modo pretensioso, assim como muitos escribas e fariseus.

De acordo com o Catecismo da Igreja Católica:

A sociedade garante a justiça social, quando realiza as condições que permitem às associações e aos indivíduos obterem o que lhes é devido, segundo a sua natureza e vocação. A justiça social está ligada ao bem comum e ao exercício da autoridade. (CATECISMO DA IGREJA CATÓLICA, Artigo 3, N°1928)

Como vimos, a autoridade no tempo de Jesus estava ligada aos doutores da lei. Esses deveriam fazer jus à justiça social alicerçada no livro das leis e dos profetas. Contudo em função de interesses políticos e classistas a lei vinha sendo adulterada em sua interpretação. Se por um lado a interpretação antiga provocava conformismo religioso, alienação política e desigualdade social, as bem-aventuranças de Jesus libertavam os homens para que eles fossem verdadeiramente livres, fazendo-os rever os conceitos distorcidos de felicidade e eleição.

 

Segundo Rohden (ROHDEN, 1997 p. 18), a partir dessa nova concepção de felicidade é que se instaurará o Reino de Deus, onde os seus verdadeiros participantes são os humildes, mansos, aflitos, os que buscam a verdade, os misericordiosos, os puros de coração, os pacificadores etc.

No dia seguinte, Jesus resolveu partir para a Galileia e encontrou Filipe. Jesus lhe disse: "Segue-me". Filipe era de Betsaida, a cidade de André e de Pedro. Filipe encontrou Natanael e lhe disse: "Encontramos aquele de quem escreveram Moisés, na Lei, e os profetas: Jesus, filho de José, de Nazaré". Perguntou-lhe Natanael: "De Nazaré pode sair algo de bom?" Filipe lhe disse: "Vem e vê". (BÍBLIA SAGRADA, João 1, 43-46)

Observamos, a partir do Evangelho de João, que além de pessoas, religiões e profissões, em Israel, alguns locais também sofriam marginalização, ou seja, se o local era pobre e sem expressão histórica, nada que viesse de lá poderia ser bom. Podemos, por esse olhar, perceber que Jesus também sofria discriminação por parte dos Israelitas em função da sua origem natal.

O resgate social é percebido em cada momento da vida pública de Jesus. Seus questionamentos abalam as estruturas sociais e religiosas do seu tempo. Segundo Candiotto, no momento em que Jesus se revela como o Messias à samaritana, mulher estrangeira considerada impura e de má conduta segundo o pensamento judaico, é estabelecido um novo parâmetro social e religioso; trata-se de um processo de reconhecimento, valorização e inclusão.

 

Em Israel, como vimos anteriormente, a mulher sofria uma exclusão exacerbada. Contudo, no Caminho de Jesus de Nazaré, ela é reconhecida. Além da samaritana, Candiotto se refere a outras mulheres: “eis o nome de algumas delas: Maria Madalena, Maria, mãe de Tiago menor e de José, Marta e Maria” (CANDIOTTO, 2008, p.68).

 

Assim, Jesus seguia seu caminho de inclusão e justiça, fazendo valer a Palavra de Deus, em que não há distinção de gênero; embora haja papéis diferentes, todos são vistos em igualdade de valor e dignidade. Poderíamos relatar outras tantas relações de inclusão disseminadas por Jesus, sua relação com os pobres, os doentes, as crianças, entre outros.

 

Contudo objetivamos o nosso olhar para as relações de resgate social, por ele vividas, apontando para o processo de desmarginalização, de reintegração social, expresso nas passagens do Novo Testamento no que diz respeito à construção da ideia de “próximo”, ignorando a tradição em relação à segregação religiosa, desinstituindo a imagem de santo e pecador, questionando o conceito de pureza e impureza, lutando contra a hipocrisia religiosa, desconstruindo a conceito de lugar santo, criticando o pensamento dos ricos entre outras reformas sociais e religiosas.

Assim, a partir dessas denúncias, Jesus, resgatando socialmente os que ele chamou de pequenos do Reino, inicia um processo de libertação do povo, alicerçando a sociedade dentro de uma justiça social inclusiva. De acordo com Isidoro Mazarrolo (MAZZAROLO, 2004. P. 98-99), após vários conflitos com os fariseus e os escribas, Jesus apresenta sua comunidade de apóstolos.

 

Eram eles: Simão, também chamado Pedro, e André, seu irmão; Tiago, filho de Zebedeu, e João, seu ir mão; Filipe e Bartolomeu; Tomé e Mateus, o publicano; Tiago, o filho de Alfeu, e Tadeu; Simão, o Zelote, e Judas Iscariotes, aquele que o traiu. (BÍBLIA SAGRADA, Mateus 10, 2-4)


Em sua maioria, vindos da Galileia, cidade pobre e muito violentada por Roma (RIBEIRO JÚNIOR, 2009), os discípulos seguem o chamado de Jesus. Entre eles encontramos um cananeu, um publicano, pescadores, zelotas, entre outros, ou seja, um grupo bem heterogêneo. Contudo tinham, entre si, uma característica em comum: não eram homens ricos ou de uma classe social privilegiada.

A partir dessa amostragem torna-se mais fácil a admissão de que Jesus escolheu para seus seguidores os excluídos e marginalizados, como já citamos anteriormente, sendo eles: as crianças, as mulheres, os doentes, os pobres, os homens e mulheres de má fama entre outros. Todos aqueles que, de alguma forma, encontravam-se fora dos benefícios e vantagens que oferecia o sistema opressor e absolutista da época, ainda que todo Israel sofresse, de alguma forma, com o imperialismo romano. Assim, inicia-se o discurso salvífico do mestre Jesus reconhecendo os marginalizados e excluídos do povo como as verdadeiras sementes da nova sociedade.

O DISCURSO SALVÍFICO DO MESTRE JESUS

O discurso salvífico de Jesus caracterizou-se pelo movimento de transignificação da imagem dos excluídos e dos marginalizados para a de verdadeiramente felizes; uma nova perspectiva de salvação e eleição que tem como cerne a pregação das Boas-Aventuranças (BÍBLIA SAGRADA, Mateus 5, 1-10). Para Jesus, felizes são os pobres em espírito, os mansos, os aflitos, os que têm fome e sede de justiça, os misericordiosos, os puros de coração, os pacificadores, os perseguidos pela justiça corrupta e os que serão maltratados por proclamarem a vida e a liberdade (MESTERS, 1971. p. 150).

Bem-aventurados vós, os pobres, porque vosso é o Reino de Deus. Bem- aventurados vós, que agora tendes fome, porque sereis saciados. Bem- aventurados vós, que agora chorais, porque haveis de rir. Bem-aventurados sereis quando os homens vos odiarem, quando vos rejeitarem, insultarem e proscreverem vosso nome como infame, por causa do Filho do Homem. Alegrai- vos naquele dia e exultai, porque no céu será grande a vossa recompensa; pois do mesmo modo seus pais tratavam os profetas.

Mas, ai de vós, ricos, porque já tendes a vossa consolação! Ai de vós, que agora estais saciados, porque tereis fome! Ai de vós, que agora rides, porque conhecereis o luto e as lágrimas! Ai de vós, quando todos vos bendisserem, pois do mesmo modo seus pais tratavam os falsos profetas (BÍBLIA SAGRADA, Lucas 6, 20-26).

 

Dentro dessa perspectiva de vida feliz, a necessidade de se promover a liberdade torna-se parte intrínseca do seu discurso salvífico, pois é crível a ideia de que a imagem de liberdade proferida por ele passa pela experiência do povo durante o período de escravidão no Egito, no exílio na Babilônia e na política opressora e absolutista de Roma. 

Por esse motivo,em Jesus, libertar é alforriar a alma e, ainda, pagar por esse resgate; preço que pode nos custar a própria vida (FERRARO, 2005, p. 135). Assim, olhando para a cruz de Jesus, podemos perceber, hoje, outras crucificações, não, apenas pessoais, mas, principalmente, as crucificações coletivas, ou seja, étnicas, sociais, religiosas e, ainda, de gênero (ibidem, p. 139, et seq).

De acordo com Isidoro Mazzarolo o discurso salvífico de Jesus ganha força no Evangelho de Lucas ao afirmar que “a pedagogia da inclusão confere ao evangelho uma pintura clara da perspectiva geral das atitudes de Jesus e por isso a obra recebe com mérito o título de evangelho sociológico”(MAZZAROLO, 2012, p. 18). Dentro da pregação do Reino, Jesus afirma que não há lugar para os que se acham sábios, santos, justos, piedosos e politicamente corretos, pois para o mestre de Nazaré o Reino de Deus não suporta os arrogantes, prepotentes e os autossuficientes. Lucas aponta o caminho para o Reino de uma forma bem singular: simplicidade, humildade e benevolência.

 

Eu, porém, vos digo a vós que me escutais: Amai os vossos inimigos, fazei o bem aos que vos odeiam, bendizei os que vos amaldiçoam, orai por aqueles que vos difamam. A quem te ferir numa face, oferece a outra; a quem te arrebatar a capa, não recuses a túnica. Dá a quem te pedir e não reclames de quem tomar o que é teu. Como quereis que os outros vos façam, fazei também a eles. (BÍBLIA SAGRADA, Lucas 6, 27-31)

 

No discurso salvífico de Jesus observamos que a transignificação, ou seja, a revalorização do sujeito social e religioso gera, principalmente, a inclusão. Contudo, esse discurso não tem efeito quando não o colocamos em prática (CATALFO, 2009, p.55-90). Por esse motivo é que podemos entender que Jesus não veio, apenas, anunciar uma nova mentalidade, mas sim, incitar o povo a assumir esse novo paradigma como uma prática libertadora (MESTERS, 1971. p. 148); “portanto, se fores até ao altar para levares a tua oferta, e aí te lembrares de que o teu irmão tem alguma coisa contra ti, deixa a oferta aí diante do altar e vai primeiro fazer as pazes com o teu irmão; depois, volta para apresentar a oferta” (BÍBLIA SAGRADA, Mateus 5, 22-24).

O perdão cura e liberta (AMARAL, 1995), promove a reconciliação e tira do sujeito a culpa do pecado. Era comum na época de Jesus a doença ser vinculada ao pecado, logo, o peso social e religioso tornava-se mais devastador que a própria enfermidade. Jesus, em sua pedagogia de inclusão, ao curar as pessoas, dizia: “os seus pecados estão perdoados”13.

Podemos, a partir da compreensão do perdão, perceber que é possível a cura ser o próprio perdão. Pedro, discípulo de Jesus, pergunta-lhe acerca do perdão, pois desejava saber até quantas vezes deveria perdoar. “Então Pedro chegando-se a ele, perguntou-lhe: Senhor, quantas vezes devo perdoar ao irmão que pecar contra mim? Até sete vezes?” Jesus respondeu-lhe: "Não te digo até sete, mas até setenta e sete vezes” (BÍBLIA SAGRADA, Mateus 18, 21).

 

João Paulo II, em sua Encíclica Dives in misericordia, n° 13, § 10, nos fala que a necessidade do perdão não incute a anulação das exigências da justiça, pois, na verdade, a justiça deve ter como fim a constituição do perdão. Dessa forma, “o perdão, nem mesmo a misericórdia como sua fonte, significa indulgência para com o mal, o escândalo, a injúria causada ou ultraje feito. Em todos estes casos, a reparação do mal e do escândalo, o ressarcimento do prejuízo causado e a satisfação pela ofensa são a condição do perdão”. (JOÃO PAULO II)

Frei Nilo Agostini, a partir da interpretação de João Paulo II, afirma que a reconciliação pressupõe a necessidade de enfrentamento que, tecido de perdão, gera frutos de justiça e conversão. “Em vez do ódio, do desejo de vingança e de desforra, vive o amor, assume a cruz, cria o espaço para a fraternidade. É o amor que reconcilia” (AGOSTINI, 2012).

Partindo da explanação de Frei Nilo Agostini percebemos que o perdão atesta o amor, parte fundante da reconciliação, o que nos leva ao entendimento espiritual da palavra misericórdia. Assim, compreendendo que a libertação que gera vida é advinda desse processo de reconciliação, reconhecemos que o discurso salvífico de Jesus encontra-se fundamentado no amor incondicional que perdoa, cura e reintegra o sujeito à sociedade.

UMBANDA E CRISTIANISMO EM DIÁLOGO: UMA ANALOGIA SEMIÓTICA

O DIÁLOGO INTER-RELIGIOSO HOJE

O diálogo inter-religioso instaura uma comunicação e um relacionamento entre fiéis de tradições religiosas diferentes, envolvendo partilha de vida, experiência e conhecimento. Essa comunicação propicia um clima de abertura, empatia, simpatia e acolhimento, removendo preconceitos e suscitando compreensão, enriquecimento e comprometimento mútuos e de partilha da experiência religiosa. (DIAS, 2008. p. 126)

Hoje muito se fala a respeito do diálogo inter-religioso, contudo, observamos um empenho pouco relevante das religiões em proporcionar, entre os seus adeptos, essa prática positiva e construtiva tal como deveria ser. O que percebemos é o despertar de um diálogo midiático a partir de passeatas, manifestos entre outros, onde alguns líderes religiosos movidos, muitas das vezes, por seus posicionamentos religiosos pessoais, unem-se com o intuito de reivindicar a paz entre as religiões, utilizando, como ponto de partida, um tema bem comentado ultimamente, o da intolerância religiosa.

De acordo com o filósofo Hans-Georg Gadamer (GADAMER, 2002, p. 243), um dos grandes pensadores do século XX, o diálogo “é um atributo natural do homem” e é a partir dele que o homem impetra a sua humanidade. No diálogo acontece um exercício singular de “ir além”, de ultrapassar barreiras, como podemos notar, também, na explanação etimológica da palavra “diálogo” defendida por Mota Zwinglio Dias e Faustino Teixeira na obra Ecumenismo e Diálogo Inter-Religioso, a arte do possível (DIAS, 2008).

Com base na etimologia grega do vocábulo “diálogo”, é importante ressaltar a presença de dois termos: “dia” e “logos”. A expressão “logos” cobre uma vasta gama de significados, mas indica em particular o dinamismo racional do ser humano, a capacidade humana de pensamento e raciocínio. O termo “dia”, por sua vez, expressa uma dupla ideia: alude ao que separa e divide, mas igualmente à ultrapassagem de um limite. Faz parte da natureza do diálogo a busca de uma unidade que preserve e salvaguarde a diferença e a liberdade. O diálogo autêntico traduz um encontro de interlocutores pontuado pela dinâmica da alteridade, do intercâmbio e da autoridade (ibidem, p. 124).

Por parte da Igreja Católica podemos encontrar um excelente apontamento sobre necessidade de dialogar “com pessoas e comunidades de outras confissões religiosas, para um mútuo conhecimento e um recíproco enriquecimento” (SECRETARIADO PARA OS NÃO CRISTÃOS, nº 3). O documento Secretariado para os Não Cristãos aborda muito bem necessidade e os benefícios que traz esse tipo de diálogo. Entretanto, em relação às outras igrejas cristãs, principalmente as fundamentalistas, o assunto diálogo inter-religioso não tem, ainda, grande relevância.

Compreendemos que essa postura tem como uma das causas, por parte de alguns sujeitos e instituições religiosas, o medo de “respingar-se” por outra religião, fato compreendido, visto que a prática do diálogo acaba por expor demais os interlocutores envolvidos.

O que deve ser entendido, primeiramente, é que o diálogo ganha riqueza e sustentação, justamente, quando os sujeitos envolvidos apresentam um forte engajamento em sua fé específica, não devendo, para melhor dialogar, “romper com a religião de sua própria cultura e herança” (DIAS, 2008. p. 145).

Por esse motivo faz-se necessário, dentro das instituições religiosas, um maior esclarecimento quanto aos seus mais profundos desígnios e benefícios, mostrando ao fiel que o diálogo não pretende incitar uma dupla pertença; ao contrário, preserva as identidades, ainda que modifique a leitura de mundo dos seus participantes à “medida em que ele provoca a ruptura da monologização” (TEIXEIRA, 2010, p. 158).

Contudo, é compreensível o receio, acima mencionado, em relação a essa expressão viva e rica em diversidade que propõe o diálogo inter-religioso, por se tratar de um assunto, relativamente, recente. No entanto, com o advento da modernidade onde os campos da ciência e da comunicação apresentam-se mais acessíveis a todo sujeito, a necessidade de se relacionar com outras religiões tornou-se imprescindível quer seja no ambiente de trabalho, entre amigos e até mesmo no seio familiar. Ainda que seja recente o tema “não significa a ausência de traços germinais antecedentes, presentes em importantes teóricos e místicos de tempos anteriores, que marcaram sua reflexão por importante sensibilidade dialogal” (DIAS, 2008. P. 129).

ALTERIDADE: PEDRA ANGULAR DO DIÁLOGO INTER-RELIGIOSO

O diálogo inter-religioso visa justamente apontar os traços de “complementaridade recíproca” que vigora entre as diversas tradições religiosas. Na experiência do encontro ocorre uma “troca e condivisão dos valores salvíficos” em favor de uma transformação e enriquecimento mútuos. (TEIXEIRA, v. 3 p. 116)

Para pensarmos em diálogo se faz necessário perceber que a pluralidade das religiões é fruto da diversidade cultural do mundo, principalmente das suas tradições. Nesse contexto podemos acreditar que a revelação de Deus dar-se-á segundo as necessidades e especificidades culturais, políticas e econômicas de uma sociedade.

Por essa proposição, percebemos, a partir da nossa pesquisa, que a narrativa sociológica encontrada na Bíblia muito se assemelha com a história de exclusão e marginalização do Brasil desde o seu descobrimento. Assim, partindo dessa hipótese, podemos intuir o porquê dessa similaridade constitutiva presente nas duas religiões.

No encontro com o outro abre-se a possibilidade de captar dimensões inusitadas desta verdade que é aletheia: permanente desvelamento. O outro é capaz de favorecer a seu interlocutor, no diálogo, a captação de certos aspectos ou dimensões do mistério divino que escapam à sua visada. Há mais verdade (religiosa) em todas as religiões no seu conjunto do que numa única religião, o que também vale para o cristianismo. (TEIXEIRA, p. 6)

Concordando com Teixeira, para que haja a prática do diálogo, faz-se necessário, antes, que os seus interlocutores estejam engajados numa dinâmica de alteridade, ou seja, nutridos de um sentimento de respeito mútuo à identidade pessoal ou confessional dos sujeitos envolvidos (TILLARD, 2001, p. 35-36), valorizando e reconhecendo as suas práticas religiosas e suas experiências de revelação divina (TILLICH, 1968. p. 133). O diálogo pressupõe o aprendizado da alteridade no exercício de honrar, respeitar e ser capaz de reconhecer a riqueza existente nas outras tradições religiosas. Porém, para que o outro aconteça em nós, e para que nós aconteçamos no outro se faz necessário um profundo esvaziamento não do eu, mas de si.

De acordo com Rosangela Stürmer14, para que haja o diálogo, é imprescindível o desenvolvimento da escuta, mais do que isso, ela afirma que é uma atitude gentil e respeitosa demonstrar empatia à pregação do outro em relação à exposição da sua doutrina, pois “o conhecimento real do outro se faz através da ótica do outro” (STÜRMER, ano II, n. 15).

Stürmer alega, ainda, que “grande parte da violência religiosa é fruto da incapacidade de sair de si” (ibidem, n. 15, et seq). Nesse ponto, STÜMER encontra-se com a lógica de Lévinas, (LÉVINAS, 1993 p. 124) ao afirmar que “só é capaz do diálogo quem se esvazia”, pois aquele que se encontra absoluto, ou seja, cheio de si, não alcança essa dimensão da comunicação (STÜRMER, ano II, n. 15).

 

Na sagrada escritura judaico-cristã, encontram-se duas passagens bem significativas que abordam a questão do estar vazio para que haja uma construção. No Antigo Testamento, livro do Gênesis, capítulo 1(um), versículo 2(dois) o autor diz que, antes de Deus começar o seu processo de criação, a terra “era vazia e sem forma”. Já no Novo Testamento, Carta aos Filipenses, capítulo 2(dois), versículo 7(sete) é dito que Jesus “esvaziou-se de si mesmo”.

 

Fazendo um possível paralelismo, a partir dessas duas leituras bíblicas, notamos que para Deus agir no outro é necessário, antes, que esse outro não esteja cheio de si. Levando essa dinâmica para o diálogo inter-religioso podemos, assim, acreditar que o que possibilitou Jesus de Nazaré estar aberto a tantos diálogos, como vimos anteriormente no capítulo 2(dois), possa ter sido esse movimento de esvaziamento de si, não se fazendo Deus, ou seja, absoluto entre os homens.

Observamos, pelo presente argumento, a necessidade intrínseca da alteridade, da saída do absolutismo que faz do homem um Deus, uma verdade absoluta, para aquele que pretende, a partir das relações, principalmente, inter-religiosas, construir ou difundir um ethos comum a todos, não um ethos que venha substituir as religiões, “mas, antes, de um empenho pela paz entre os homens das diferentes religiões deste mundo, o que constitui uma necessidade urgente” (KÜNG, 2004. p. 17). Podemos, assim, suscitar que o possível “ethos universal” consista na prática do amor autêntico15 entre as criaturas, o que impulsiona o exercício da solidariedade e da justiça, uns com os outros, a partir do respeito, da escuta e do aprendizado da alteridade.

 

A ANALOGIA SEMIÓTICA

 

A opção pelos excluídos e marginalizados a partir do movimento amor, perdão e reconciliação apresentado nos discursos salvíficos, tanto na Umbanda quanto na Boa Nova de Jesus de Nazaré, nos fomentou a possibilidade dessas duas religiões terem uma semiose aproximada, ou seja, apresentarem, em suas matrizes salvíficas, um discurso paralelo. Assim como na Umbanda, no Evangelho de Jesus os signos fundantes apresentam-se à imagem dos desprivilegiados quer sejam na sociedade ou na religião. Dessa forma, a releitura desses

Para Santo Agostinho, a profunda frustração dos homens que aderiram à Cidade Terrestre é a ausência da experiência do amor autêntico. Dessa carência decorre a tristeza, pois no princípio o homem foi criado para o amor, ou seja, sendo amado reveste-se de sua dignidade de Filho de Deus. Pelo contrário, quando não ama, perde-se no vazio de sua própria insignificância. A desilusão acontece porque todos são chamados para viver com Deus eternamente, mas alguns trocam o imutável pelo mutável ocasionando a perda da paz temporal, quando os cidadãos da Cidade Celeste já participam de certo modo dos benefícios da paz definitiva. Conferir (MOURA, p. 72 - 73) os signos e a aproximação dos seus significados propiciam, através de uma analogia semiótica, a possibilidade ímpar do diálogo inter-religioso entre a Umbanda e o Cristianismo.

De acordo com Nunes Pereira, no imaginário umbandista, os personagens que representam os negros, os índios, as crianças e os marginalizados, ou seja, os sujeitos rejeitados da nossa população ganham voz e vez ao dizer que eles “denunciam a injustiça social, pondo em ‘xeque’ o enunciado de nosso hino nacional: ‘Dos filhos deste solo, és mãe gentil, pátria amada, Brasil’”. Dessa forma, assim como Nunes Pereira, pensamos que a importância secundária relegada à Umbanda, uma religião genuinamente brasileira, tenha sido uma verdadeira estratégia para calar a voz dos oprimidos (NUNES PEREIRA, 2006, p. 97).

Nesse contexto, os oprimidos tornaram-se profetas contemporâneos. Esse é, também, o processo de resgate social encontrado na Boa Nova de Jesus, no momento em que os excluídos e marginalizados passam ocupar um lugar de destaque na nova comunidade e se tornam anunciantes do Reino. O poder do estado que tende a calar a voz dos oprimidos, assim como relata Nunes Pereira, foi um dos maiores motivos da mortandade de cristãos em Israel, como podemos observar nas palavras de Paulo ao Filipenses: “Quanto à Lei judaica, fariseu; quanto ao zelo, perseguidor da Igreja; quanto à justiça que se alcança pela observância da Lei, sem reprovação” (BÍBLIA SAGRADA, Filipenses 3, 5-6). Paulo, antes da sua conversão, foi um mecanismo do estado para calar os profetas e discípulos de Jesus.

Observamos nos capítulos anteriores que as propostas salvíficas das duas religiões são muito próximas uma vez que se encontram arraigadas na mesma dinâmica de salvação, ou seja, na crença de que a libertação do homem dar-se-á, principalmente, através do perdão que implica a reconciliação. Perdão que, por sua vez, é fruto da humildade e do amor.

No hino do Centro Espírita Casa de Oxossi Umbanda e Caridade é bem notória a ideia da necessidade da humildade para a prática da caridade. “Essa casa é de Oxossi é de Oxossi caçador; essa casa é de Oxossi a cumeeira é de Xangô. Nessa casa de Oxossi só se faz a caridade; nessa casa a gente aprende a viver com humildade”.

No Novo Testamento, Paulo, em sua carta aos Filipenses, nos fala algo bem próximo a essa realidade observada no hino de abertura do Centro, no momento em que expõe a necessidade da humildade para a prática de convivência cristã. Uma alteridade peculiar que não só admite a existência do outro, mas, também, considera esse outro, superior a nós mesmos.

Se me é possível, pois, alguma consolação em Cristo, algum caridoso estímulo, alguma comunhão no Espírito, alguma ternura e compaixão, completai a minha alegria, permanecendo unidos. Tende um mesmo amor, uma só alma e os mesmos pensamentos. Nada façais por espírito de partido ou vanglória, mas que a humildade vos ensine a considerar os outros superiores a vós mesmos. Cada qual tenha em vista não os seus próprios interesses, e sim os dos outros. Dedicai-vos mutuamente à estima que se deve em Cristo Jesus. (BÍBLIA SAGRADA, Filipenses 2, 1-5, grifo nosso)

Na Umbanda, assim como na prática cristã, percebemos que a humildade é o atributo responsável pela manutenção da simplicidade e da alteridade, pedras fundamentais para o desenvolvimento de um bom diálogo. Observamos que a humildade é uma necessidade basilar e intrínseca à Umbanda e ao Cristianismo, fazendo, também, parte da sua dimensão salvífica, pois nada “mais prejudicial ao diálogo do que a atitude de arrogância identitária, de hybris totalitária. O diálogo é antes de tudo um ‘espírito’ que deve animar toda a dinâmica de atuação na história, de abertura, respeito e amizade pelos outros” (TEIXEIRA, 2010 p. 160).

Esse respeito e união são marcas latentes nas duas religiões comentadas. O Cristianismo uniu, no seu primeiro século, os judeus aos cananeus, aos samaritanos, aos pagãos, às pessoas de fama duvidosa entre outros, ou seja, nacionalidade e classes diferentes vivendo, em harmonia, uma mesma doutrina. Assim, também, acontece na Umbanda, onde a cultura dos brancos, dos negros, dos índios e dos marginalizados encontra-se em congruência dentro do rito, ainda que, cada uma com a sua particularidade.

De acordo com Gadamer, o verdadeiro diálogo gera um fruto novo, ou seja, nós conseguimos identificar na outra religião “algo que ainda não havíamos encontrado em nossa própria experiência de mundo” (GADAMER, 2002, p. 247).

Partindo da afirmação de Gadamer, aquilatamos nessa pesquisa a ideia de que o diálogo entre a Umbanda e o Cristianismo é verdadeiramente enriquecedor, pois em seu aspecto savífico, o diálogo inter-religioso tem como objetivo final, também, a reconcilição. Assim, a partir das analogias matriciais congruentes que observamos no Cristianismo e na Umbanda, passamos a perceber quão semióticas são as suas bases estatutárias, identitárias e, em uma instância maior, alteritárias dessas doutinas, no que diz respeito à opção pelos excluídos e pelos marginalizados em seu processo de reorganização social e religiosa.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Procuramos construir um paralelo entre a Boa Nova de Jesus de Nazaré e a religião de Umbanda a partir dos seus estatutos epistemológicos, ou seja, das suas bases doutrinárias fundantes que se apresentaram, em nossa pesquisa, arraigadas em uma mesma proposta social, tendo como princípio a reconstrução de um imaginário coletivo rico em diversidade, justiça e igualdade. Outro fato coincidente é que tanto a pregação de Jesus quanto o surgimento da Umbanda nasceram em meio a um período de grande opressão com as classes, culturas e etnias mais frágeis da sociedade.

Buscamos também ressaltar que a novidade que Jesus trouxe para os judeus levava à construção de uma nova sociedade partindo da opção pelos marginalizados e excluídos do povo, e que, de forma semelhante, a Umbanda apresentou esta mesma construção social e identitária. Tal paralelo nos aponta para um diálogo enriquecedor à medida que, perscrutando o imaginário umbandista, encontramos a possibilidade de observarmos a Boa Nova de Jesus mais próxima à realidade do povo brasileiro.

Na Umbanda os excluídos que ganham ascensão são pertencentes a nossa própria história de exclusão e marginalização, movimento que nos faz observar a Umbanda, não, apenas, como uma religião, mas, também, como um grande “palco do Brasil” (Prandi, 1991, p. 88), onde podemos reler, na prática (culto), a sua história de exploração e povoamento.

A ideia central da aproximação entre a Umbanda e o Cristianismo não emergiu fruto da presença marcante do sincretismo religioso vivenciado por essas duas religiões, mas sim, da pluralidade encontrada tanto no culto da Umbanda quanto na pessoa de Jesus de Nazaré, como nos aponta Edward Neves M. B. Guimarães17 ao afirmar que:

Toda tradição religiosa se concretiza como caminho de realização autêntica do ser humano e merece o respeito, a admiração e a valorização das demais tradições de sabedoria, religiosas ou não. Aqui emerge um dos principais fundamentos ou critérios para o diálogo inter-religioso: o critério antropológico. Este, como veremos mais abaixo, foi critério presente e determinante na experiência religiosa de Jesus de Nazaré. É pelos frutos que se conhece a árvore (Cf. Mt 7, 17-20). Foi critério presente na vida de homens e mulheres que souberam captar e reconhecer a beleza e a sabedoria de uma tradição religiosa diferente da sua. (GUIMARÃES, 2006, p. 86)

Tomando por base que a tradição religiosa é fruto da cultura, ou seja, da experiência humana, podemos identificar em seus cultos variedades de interpretações da revelação divina. Desta forma, como afirma Guimarães, assim como a religião, por um lado, expressa uma experiência de salvação, por outro, está sujeita ao erro, ao afastar-se do outro, movida pela sua verdade contundente (Ibidem, 2006, 86-87). Contudo, não foi essa prática que encontramos em Jesus e na Umbanda. Neles identificamos justamente uma abertura grande ao outro.

Na Umbanda as etnias, as religiosidades e as classes sociais, dentro do rito, vivem em plena harmonia umas com as outras. Dessa forma, compreendendo que a vida social do umbandista deve ser uma extenção da espiritualidade experimentada no culto, os adeptos da Umbanda são convidados a levarem essa dinâmica religiosa para o seu cotidiano.

Assim, também, observamos na experiência de fé de Jesus de Nazaré, desde a escolha dos seus discípulos até os diálogos ricos em diversidade e alteridade que encontramos nos Evangelhos, tais como o diálogo de Jesus com a samaritana, com a cananeia, com o centurião pagão, entre outros. Dessa forma, concluímos que, a partir da experiência de fé e alteridade expressa nesses dois discursos salvíficos, a prática do diálogo interreligioso não diminui ou “respinga” a pertença religiosa dos sujeitos, pelo contrário, fortalece a sua identidade e a sua pertença religiosa a partir do momento em que o incita à reflexão, à troca de bases, ao amadurecimento da própria fé e dos objetivos desta.

O Brasil atravessa um momento, ainda, de grande exclusão e marginalização quer seja cultural, religiosa, política ou econômica, cujos sujeitos desse processo permanecem os mesmos desde o período colonial. Logo, temos no imaginário umbandista a possibilidade ímpar, a partir do diálogo inter-religioso, de compreender os processos de resgate cultural que propõe essa religião através do seu culto ao divino e da sua compreensão do sagrado. Contudo, são justamente os personagens desse imaginário que retratam a figura dos excluídos e marginalizados do nosso país que, hoje, são alvos de intolerância e discriminação, principalmente, entre as religiões cristãs fundamentalistas.

Para que haja um diálogo inter-religioso enriquecedor é preciso descobrir na pluralidade a presença de um Outro, além da criatura e do criado; e, também, um outro, além do “eu”. Segundo o padre Leomar Antônio Brustolin (BRUSTOLIN, 2012), o totalmente Outro “se manifesta e se revela não apenas numa ou noutra religião, mas está presente em toda forma humana de transcender”. Ele afirma, ainda, que a “passagem do monólogo para o diálogo é extremamente importante, pois o diálogo exige escutar o outro, descobrir e reconhecer seus valores”. Ou seja, o diálogo inter-religioso só acontece dentro do respeito, da tolerância e da alteridade.

Sendo assim, corroborando com a afirmativa de Brustolin, quando, por exemplo, acusamos uma pessoa ou uma religião de estar, em suas manifestações religiosas, possuída por demônios, rompemos com a diversidade e com o direito de o outro expressar a sua religiosidade e transcendência. No Novo Testamento há uma passagem que retrata bem essa afirmativa, quando Jesus é acusado pelos fariseus:

 

E todas as multidões ficaram admiradas, e perguntavam: Não será Ele o filho de David? Os fariseus, ao ouvirem isto, e disseram: Ele expulsa os demônios através de Belzebu, o príncipe dos demônios! Sabendo o que eles estavam a pensar, Jesus disse: Todo o reino dividido em grupos que lutam entre si será arruinado. E toda a cidade ou família dividida em grupos que brigam entre si não poderá durar. E se Satanás expulsa Satanás, ele está dividido contra si mesmo. Como é que o seu reino poderá subsistir? Se é através de Belzebu que Eu expulso os demônios, através de quem os expulsam os vossos filhos? Por isso, serão eles mesmos que vos julgarão. Mas se é através do Espírito de Deus que Eu expulso os demônios, então o Reino de Deus chegou até vós. (BÍBLIA SAGRADA, Mateus 12, 9-14).

O reconhecimento do outro enquanto sujeito religioso e o respeito pela sua forma de expressar a fé é parte intrínseca do processo de diálogo. O diálogo inter-religioso, mais do que tolerância, implica a partilha da vida, a troca de experiências e de conhecimentos (DIAS, 2008. p. 141). A riqueza do diálogo está justamente nesse intercâmbio da fé que, ao contrário do que muitos pensam, não põe em risco a pertença religiosa dos sujeitos envolvidos, mas, ao contrário, reafirma a sua identidade.

De acordo com Buber (BUBER, 1977, p. 32), “O homem se torna eu na relação com tu”. Dessa forma, em uma esfera mais intensa de diálogo encontra-se a experiência religiosa, ou seja, o encontro de pessoas que, enraizadas nas suas pertenças específicas, compartilham entre si experiências de oração e contemplação da fé, assim como a experiência concreta destas (SECRETARIADO PARA OS NÃO CRISTÃOS, nº 35).

A tolerância é o princípio da possibilidade do diálogo, enquanto a intolerância aponta para um profundo despreparo religioso e social. Assim, devemos, como sujeitos religiosos, compreender que o espaço transcendental do outro é, também, um solo sagrado, e por isso, exige de nós verdadeira coragem para, ao invés de acusá-lo, conhecê-lo e percebê-lo, ultrapassando as barreiras do nosso “si”, e assim, fraternalmente, ir construindo mais o nosso “eu” (PANIKKAR, 1993, p. 1149).

Dessa forma, compreendemos que o grande enriquecimento na fé que o diálogo pode proporcionar aos seus interlocutores é no âmbito da cooperação pela manutenção e promoção da paz. Um diálogo que leve à obra, à prática do bem em favor de um mundo mais justo e igualitário (SECRETARIADO PARA OS NÃO CRISTÃOS nº 29).

Concluímos, assim, que o princípio salvífico da Umbanda está em congruidade com os mesmos estatutos epistemológicos fundantes da Boa Nova de Jesus de Nazaré, percebemos uma possibilidade ímpar, através do diálogo inter-religioso, de uma caminhada conjunta em direção ao processo de resgate social tão arraigado na doutrina da Umbanda e no princípio do Cristianismo.

Esse é o nosso desafio, na realidade plural em que vivemos: não nos apegarmos às diferenças para nos segregarmos, mas nos apegarmos às semelhanças para lutarmos juntos por uma aproximação fraterna em prol de uma sociedade de paz. E são os desafios dessa realidade que devem compor a agenda do diálogo inter-religioso.

Há que dialogar “para não morrer” e não deixar morrer, ou de forma mais precisa, há que dialogar para manter-se arejado e responder aos desafios do tempo, bem como buscar formas novas de cooperação contra o sofrimento que golpeia a terra e os povos que nela habitam. (TEIXEIRA, 2010 p. 163-164)

Enfim, é fundamental que as religiões compreendam a necessidade do diálogo inter- religioso em seu mais profundo sentido e intenção. As religiões que, hoje, em prol dos interesses pessoais quer sejam políticos, econômicos ou culturais negligenciam a possibilidade de convivência harmônica e contemplativa com outras religiões, de certa forma, “deixam em aberto a essencial tarefa de oxigenar de sentido a humanidade, perdem a sua relevância” (ibidem, p. 163-164).

Assim como convidamos a Umbanda e o Cristianismo, a partir da analogia semiótica percebida em seus discursos salvíficos, ao diálogo, convidamos, também, outras religiões a fim de que possam participar dessa responsabilidade sobrevivencial que é o movimento pela união dos povos da terra.

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TEIXEIRA, F. A Experiência de Deus nas Religiões. Numen; Revista de estudos e pesquisa da religião, Juiz de Fora, v. 3. Disponível em: <http://www.editoraufjf.com.br/revista/index. php/numen/article/viewFile/866/751> Acesso em: 23 de agosto de 2012

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TRINDADE, L. M. S. Exu: símbolo e função. São Paulo: FFLCH-USP, 1985. TILLARD, J. M. Dialogare per non morire. Bologna: EDB, 2001.

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RIBEIRO, Daniel Gomes. UMBANDA E CRISTIANISMO EM DIÁLOGO:

Uma analogia semiótica a partir do resgate social transignificado à imagem dos excluídos e dos marginalizados. Rio de Janeiro: FSB/RJ, 2012

 

Monografia do Curso Especialização em Ciências das Religiões, apresentada à Faculdade de São Bento do Rio de Janeiro, no Programa de Pós-graduação Lato Sensu.

 

Orientador: Prof. Dr. Pe. Luís Maurício, msc

 

Palavras-chave: Umbanda, Cristianismo, Diálogo Inter-religioso, Alteridade

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